Caso Benício: médica usava carimbo de pediatria sem ter especialidade e pode responder por falsidade ideológica, diz delegado

Resumo

  • Justiça revoga habeas corpus de médica investigada por prescrever adrenalina A médica Juliana Brasil, investigada pela morte do menino Benício Xavier, de 6 anos, pode responder pelos crimes de falsidade ideológica e uso de documento falso, além de homicídio doloso por dolo eventual.
  • A médica admitiu o erro em um documento enviado à polícia e em mensagens em que pediu ajuda ao médico Enryko Queiroz, mas a defesa dela afirma que a confissão foi feita “no calor do momento”.
  • Todas as regulamentações do Conselho Federal de Medicina indicam que o médico que não possui uma especialização não pode se identificar de nenhuma forma, com nenhuma referência a uma especialidade que ele não possui, e ela fez isso”, afirmou o delegado Marcelo Martins.
  • Equipe de enfermagem escondeu prescrição de adrenalina A prescrição da adrenalina aplicada na veia de Benício Xavier foi escondida por duas profissionais de enfermagem por medo de que a médica responsável, Juliana Brasil, alterasse o documento após perceber o erro, segundo depoimentos à Polícia Civil.

Justiça revoga habeas corpus de médica investigada por prescrever adrenalina

Justiça revoga habeas corpus de médica investigada por prescrever adrenalina

A médica Juliana Brasil, investigada pela morte do menino Benício Xavier, de 6 anos, pode responder pelos crimes de falsidade ideológica e uso de documento falso, além de homicídio doloso por dolo eventual. A informação foi confirmada pelo delegado Marcelo Martins, do 24º Distrito Integrado de Polícia (DIP), responsável pela investigação do caso, em Manaus.

Benício morreu na madrugada do dia 23 de novembro. A médica admitiu o erro em um documento enviado à polícia e em mensagens em que pediu ajuda ao médico Enryko Queiroz, mas a defesa dela afirma que a confissão foi feita “no calor do momento”.

A técnica de enfermagem Raiza Bentes Paiva, responsável pela aplicação do medicamento, também é investigada. Ela afirmou em depoimento que apenas seguiu a prescrição ao aplicar a adrenalina de forma intravenosa e sem diluição. Disse também que informou a mãe de Benício sobre o procedimento e mostrou a prescrição antes de fazer a aplicação.

Segundo o delegado, a Polícia Civil realizou uma análise sobre a forma como a médica se identificava profissionalmente. De acordo com a apuração, Juliana Brasil utilizava carimbo e assinaturas com referência à especialidade de pediatria, mesmo sem possuir o título oficialmente reconhecido.

“Nós realizamos um estudo a respeito da questão dela ter assinado a especialização pediatria no carimbo e ter assinado o nome dela com a expressão pediatria. Todas as regulamentações do Conselho Federal de Medicina indicam que o médico que não possui uma especialização não pode se identificar de nenhuma forma, com nenhuma referência a uma especialidade que ele não possui, e ela fez isso”, afirmou o delegado Marcelo Martins.

Ainda conforme o delegado, a conduta pode configurar dois crimes distintos.

“Então, isso configura o crime de falsidade ideológica e o uso de documento falso. A investigação prossegue agora também com relação a esses dois crimes, além do homicídio doloso por dolo eventual”, disse.

A Polícia Civil segue colhendo depoimentos e analisando documentos para esclarecer as circunstâncias do atendimento e eventuais responsabilidades criminais.

O Hospital Santa Júlia não se pronunciou sobre Juliana Brasil não ter especialidade em pediatria e atuar no setor da unidade.

Médica Juliana Brasil pode responder por falsidade ideológica ao usar carimbo de pediatria sem especialidade — Foto: Reprodução

A Sociedade Brasileira de Pediatria (SBP) permite que médicos obtenham o Título de Especialista em Pediatria (TEP) sem residência, por meio da aprovação na Prova de Título (TEP).

A defesa da médica afirmou à Rede Amazônica que, embora Juliana Brasil não tenha o título de especialista em pediatria, ela é formada desde 2019 e atuava legalmente na área, acumulando experiência prática. Os advogados acrescentaram que ela pretendia realizar a Prova de Título neste mês de dezembro.

Equipe de enfermagem escondeu prescrição de adrenalina

A prescrição da adrenalina aplicada na veia de Benício Xavier foi escondida por duas profissionais de enfermagem por medo de que a médica responsável, Juliana Brasil, alterasse o documento após perceber o erro, segundo depoimentos à Polícia Civil.

A enfermeira Francineide Macedo e da técnica Tabita Costa relataram à Polícia Civil que mantiveram a prescrição original, assinada por Juliana, para impedir que fosse substituída por uma nova, o que poderia interferir na apuração do caso.

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O caso

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Segundo o pai, Bruno Freitas, o menino foi levado ao hospital com tosse seca e suspeita de laringite. Ele contou que a médica prescreveu lavagem nasal, soro, xarope e três doses de adrenalina intravenosa, 3 ml a cada 30 minutos.

A família disse ao g1 que chegou a questionar a técnica de enfermagem ao ver a prescrição. De acordo com Bruno, logo após a primeira aplicação, Benício apresentou piora súbita.

“Meu filho nunca tinha tomado adrenalina pela veia, só por nebulização. Nós perguntamos, e a técnica disse que também nunca tinha aplicado por via intravenosa. Falou que estava na prescrição e que ela ia fazer”, relatou o pai.

Após a reação, a equipe levou a criança para a sala vermelha, onde o quadro se agravou. A oxigenação caiu para cerca de 75%, e uma segunda médica foi acionada para iniciar o monitoramento cardíaco. Pouco depois, foi solicitado um leito de UTI, e Benício foi transferido no início da noite de sábado.

Na UTI, segundo o pai, o quadro piorou. A equipe informou que seria necessária a intubação, realizada por volta das 23h. Durante o procedimento, o menino sofreu as primeiras paradas cardíacas.

O pai relatou que o sangramento ocorreu porque a criança vomitou durante a intubação. Após as primeiras paradas, o estado de Benício continuou instável, com oscilações rápidas na oxigenação. Minutos depois, Benício apresentou nova piora e não respondeu às manobras de reanimação. Ele morreu às 2h55 do domingo.

“Queremos justiça pelo Benício e que nenhuma outra família passe pelo que estamos vivendo. O que a gente quer é que isso nunca mais aconteça. Não desejamos essa dor para ninguém”, disse o pai.

Em nota, o Hospital Santa Júlia informou que uma médica e uma técnica de enfermagem foram afastadas de suas funções e realizou uma investigação interna pela Comissão de Óbito e Segurança do Paciente.

Infográfico – Caso Benício — Foto: Arte g1

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